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Foto do escritorNayara Reynaud

O CHÃO SOB MEUS PÉS | Estabilidade imaginária

Atualizado: 8 de out. de 2020


Valerie Pachner e Pia Hierzegger em cena do filme austríaco O Chão Sob Meus Pés (2019), de Marie Kreutzer | Foto: Divulgação (Supo Mungam Films | Créditos: Juhani Zebra)

Quando o espectador conhece a protagonista do filme austríaco O Chão Sob Meus Pés (Der Boden unter den Füßen, 2019), a imagem inabalável de Lola Wegenstein (Valerie Pachner) torna difícil figurar o que seria capaz de “tirar o chão” desta bem-sucedida consultora executiva. Mas logo o quarto longa de Marie Kreutzer, diretora de Gruber Geht (2015) e outros títulos não lançados no Brasil, mostra a que preço a personagem workaholic mantém tal postura para avançar na carreira. O primeiro deles é deixar de dormir e virar noites em turnos de 48 horas para finalizar os projetos da consultoria em que trabalha, responsável por ajudar na transição e reestruturação de empresas – nem que isso signifique sacrificar um bom número de funcionários que ficarão sem emprego.


Isso significa não apenas suprimir o sono, mas também se abster das emoções, focando-se somente no trabalho, esquecendo de suas relações pessoais, sejam familiares ou amorosas, como a parca relação que mantém em segredo com sua chefe Elise (Mavie Hörbiger). Até que uma ligação de Viena, faz esta profissional, a quem os colegas julgam ser “sozinha no mundo”, escapar do serviço na Alemanha e voltar para casa na Áustria, quando sua irmã mais velha é internada em uma clínica, após ter uma overdose de medicamentos. E enquanto Lola tenta se enganar que isto não foi uma tentativa de suicídio de Conny (Pia Hierzegger), que sofre de esquizofrenia, o espectador observa que, por baixo de sua figura impecavelmente resoluta, reside o medo de ter herdado a tendência familiar para transtornos mentais, como o que abateu a mãe delas.


O longa exibido na competição do Festival de Berlim do ano passado, bem como no último Festival do Rio, adiciona, então, uma dose paranoica à narrativa a partir do momento em que a protagonista passa a duvidar de sua própria sanidade ou se está sendo manipulada: a irmã lhe liga dizendo que é vítima de maus-tratos, mas as evidências dizem que essa ligação pode nunca ter existido. A tensão imposta não é bem retribuída pelo filme, que não investe propriamente no thriller psicológico, se desiquilibrando por não se debruçar igualmente no drama familiar e pessoal da personagem. Assim, ao mesmo tempo em que Kreutzer não se aproveita do tema para tornar a história em um suspense barato, a simples sugestão disso sem o aprofundamento das questões de saúde mental e seus efeitos colaterais a quem convive com os pacientes mina esse arco dramático.


A obra é um pouco mais consistente na abordagem das exigências profissionais no mundo corporativo contemporâneo. Além de apresentar esta demanda por eficiência acima de tudo, demonstra esta cobrança em Lola, e também em Elise, por um comportamento irredutível e pragmático, quase masculino, em vez de aproveitar das qualidades femininas para um melhor ambiente de trabalho. Essa frieza obrigatória invade o próprio filme e, embora isso seja totalmente condizente com a trajetória de sua protagonista, não permite que o público se aproxime tanto dela e crie toda a empatia necessária, por mais que a boa interpretação de Valerie Pachner em todos os nuances de uma personagem que esconde seus sentimentos seja o esteio deste Chão instável.

 

O Chão Sob Meus Pés (Der Boden unter den Füßen, 2019)

Duração: 108 min | Classificação: 14 anos

Direção: Marie Kreutzer

Roteiro: Marie Kreutzer

Elenco: Valerie Pachner, Pia Hierzegger, Mavie Hörbiger, Michelle Barthe, Marc Benjamin, Dominic Marcus Singer e Meo Wulf (veja + no IMDb)

Distribuição: Supo Mungam Films

Plataforma: Espaço Itaú Play (streaming via Looke), de 26 e 27 de junho de 2020 (Festival de Pré-estreias Online) | NOW e Vivo Play (VOD), a partir de 8 de outubro de 2020



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