ARKANSAS | A aridez da floresta
Atualizado: 25 de set. de 2020
Não sendo o mais famoso dos estados norte-americanos, o Arkansas é a estrela do filme homônimo realizado por um nativo de lá: o ator Clark Duke, mais conhecido pelos filmes – e sequências – de Kick-Ass e A Ressaca, em seu primeiro longa como diretor. Mas em Arkansas (2020), o lugar não apenas dá título e serve de cenário à adaptação cinematográfica do livro de mesmo nome, publicado por John Brandon em 2008, mas também transmite um espírito aprisionador de inevitabilidade que vem de encontro com o tema da trama. Esse sentimento já é descrito na epígrafe do autor local Charles Portis (1933-2020), que versa sobre como os nascidos naquele estado não conseguem fugir dele, voltando cedo ou tarde, algo semelhante ao divórcio impossível de quem se envolve com o tráfico, a exemplo dos personagens desta história.
O roteiro adaptado por Duke e Andrew Boonkrong, que já escreveu com ele o curta Show Business (2017), traz um olhar menos glamourizado para o crime organizado, lembrando que nem sempre ele faz valer o seu adjetivo. Assim, o público conhece primeiro os jovens traficantes Kyle (Liam Hemsworth) e Swin (interpretado pelo próprio Clark) ao assumir um novo posto na “organização”, disfarçados dentro de um parque estadual em Arkansas, comandado pelo guarda florestal Bright (John Malkovich, em um papel até pequeno), para distribuir a mercadoria por todo o Sul dos Estados Unidos. Mas quando uma entrega não sai como o esperado, os dois funcionários tentam esconder o ocorrido, antes que o mítico chefão da gangue, chamado Frog, saiba o que aconteceu.
Se os dois não sabem quem ele é, o longa adianta para o espectador que se trata do velho dono de uma espécie de loja de penhores, interpretado por Vince Vaughn, pois a narrativa, dividida em cinco capítulos, intercala o presente dos dois protagonistas com o passado de Frog entrando para este mundo. Aliás, é mais interessante ver a trajetória pregressa dele, especialmente na troca do ator com Michael Kenneth Williams, na pele de seu antigo chefe local Almond, do que necessariamente a trama principal, que tem dificuldades para encontrar seu tom. Se os flashbacks exploram a típica dinâmica de confiança e traição nas relações criminais, pode se dizer que o clichê bem trabalhado desses segmentos é mais engajador que a até bem-vinda idiossincrasia do arco fundamental.
Com um ar de filme dos irmãos Coen em cenário sulista, Arkansas fica entre o neo noir, com seu niilismo pairando desde a abertura, e certa comédia de erros que, por vezes, não consegue atingir seu potencial cômico. Essa dificuldade em encontrar um tom pode ser observada na caracterização dos personagens principais, embora a montagem também suprima muito de uma possível construção deles e do relacionamento de Swin com a enfermeira Johnna (Eden Brolin, filha do ator Josh Brolin). Assim, ao mesmo tempo em que há peculiaridades que distinguem a obra, a irregularidade ao criar esse clima próprio acaba restringindo a produção cercada de grandes nomes, não só no elenco, mas também na trilha sonora, cuja parte incidental é assinada por Devendra Banhart e Noah Georgeson, e ainda traz versões interpretadas pela banda Flaming Lips.
Apesar disso e da falta de interesse em se aprofundar nas intricadas questões sociais deste contexto, seja regional ou do tráfico de drogas, há no subtexto e, em momentos específicos nos diálogos, uma abordagem de como até o imaginário da criminalidade está imbuído deste “Sonho Americano”, cuja busca é tão inexorável quanto a falência de sua realidade.
Arkansas (Arkansas, 2020)
Duração: 117 min | Classificação: 18 anos
Direção: Clark Duke
Roteiro: Clark Duke e Andrew Boonkrong, baseado no livro “Arkansas” de John Brandon
Elenco: Liam Hemsworth, Vince Vaughn, Clark Duke, John Malkovich, Eden Brolin, Michael Kenneth Williams, Vivica A. Fox e Chandler Duke (veja + no IMDb)
Plataforma: Amazon Prime Video (streaming), a partir de 7 de agosto de 2020 | Apple TV (iTunes), Google Play, Oi Play, Vivo Play e YouTube, já disponível
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