Mapa Sonoro de Salvador | Da Cidade Baixa à Alta, a música percorre os (soteropolit)anos
Atualizado: 10 de abr. de 2021
No dia em que a primeira capital do Brasil, então chamada de São Salvador da Bahia de Todos os Santos, completa nada menos que 469 anos, o NERVOS comemora este aniversário com uma playlist soteropolitana que vai de Itapuã à Ilha da Maré, passando pela Cidade Baixa e subindo o Elevador Lacerda para seguir pela Cidade Alta, só com músicas que mostram cada cantinho de Salvador.
Antes de passar uma tarde em Itapuã, uma manhã de Sol em Piatã e no Abaeté
Bairro do extremo leste da ampla costa da cidade, Itapuã ficou marcado pela figura de seu ilustre morador, Dorival Caymmi que cantou suas belezas em Saudade de Itapoã e sua rotina em tantas outras canções. Sua ligação com o local se tornou tão marcante, que também foi transposta em versos por Vinícius de Moraes e Toquinho, no clássico Tarde em Itapoã em que citam a Praça Caymmi, e pelo conterrâneo Caetano Veloso, que o transforma em vento em Itapuã.
Sua praia também foi celebrada por Luiz Ayrão, que no seu desfilar de importantes balneários brasileiros de Hino ao Verão, recorda também da praia vizinha, a de Piatã. A ponte do bairro abaixo da tranquila morada de Caymmi foi lembrada pela fluminense e “Nova Baiana” Baby do Brasil, em O Jarro. Aliás, um dos pontos turísticos desta região, a Lagoa do Abaeté, comentada igualmente por Veloso na música citada, ganhou uma composição especial de Dorival, que conta A Lenda do Abaeté.
As águas de Iemanjá da Boca do Rio à Ondina
Natural de Conceição, na Paraíba, Elba Ramalho ficou conhecida em todo o Brasil, no início dos anos 1980, cantando sobre a “morena bonita da Boca do Rio” em Banho de Cheiro, um frevo que também fala do Senhor do Bonfim, cuja devoção é muito grande na Bahia, especialmente na capital. Seguindo ao sul da orla soteropolitana banhada pelo Oceano Atlântico, Amaralina foi descrita pelo seu mar por Nelson Rufino, em Nas Águas de Amaralina, e outras belezas naturais por Raul Seixas, na banda estilo Beatles encontra a Jovem Guarda que teve no início de carreira, Raulzito e os Panteras, com a canção Menina de Amaralina. Já Oswaldo Fahel, compôs a Morena Do Rio Vermelho, ao frequentar os saraus do bairro, cuja praia é local de celebração à Iemanjá todo dia 2 de fevereiro.
Na sequência, vem a Ondina, perguntada “onde andarás” no samba de Nei Lopes, que ainda cita a Boca do Rio e a Pero Vaz, que fica do outro lado, perto da Liberdade. A gente de Ondina é lembrada pela Timbalada em Cachaça, composição de Carlinhos Brown, que também fala das águas de Ondina, Rio Vermelho, Pituba e Amaralina em Regionágua, gravada pelo grupo que mistura axé e ritmos latinos Electrotimba.
Barra-Ondina ou Campo Grande, todo lugar é festa em Salvador
“O farol ilumina Salvador (...), todo dia é festa em Salvador”, dizia Netinho em Beijo na Boca, um dos hits cantados pelo cantor ou pelos colegas no Carnaval baiano, onde as músicas só têm um dono: o povo. Ele pode percorrer, com seus abadás, o circuito Barra-Ondina, que segue a orla até o famoso Farol da Barra ou o popular de Campo Grande, como canta o clássico da Bandamel, Baianidade Nagô, que fala da “Avenida Sete (de Setembro)”, que vai do cartão-postal da Barra e se transforma no arborizado “Corredor da Vitória” até o Campo Grande. Ali embaixo, banhado pela Baía de Todos os Santos, de um radinho de pilha lá da Gamboa, toca Largadinho, de Claudia Leitte, com mais uma das tantas músicas que fazem a grande festa da cidade.
A Cidade Alta e o coração de timbal de Salvador
Subindo para a Cidade Alta, o bairro da Federação foi só um dos recordados por Caetano Veloso em Beleza Pura, que vai de leste, na Boca do Rio, a oeste, no Curuzu, pertinho da Liberdade. Mas, provavelmente, você vai querer beber a Água Mineral ali do lado, do Candeal, reduto da Timbalada – que fala do local não só no seu maior hit. Tanto que Daniela Mercury fala dos timbaleiros e do fundador do grupo, Carlinhos Brown, em Domingo no Candeal, enquanto Ivete, à frente da Banda Eva, cantava da festa no local em Levada Louca.
De um dos maiores bairros da cidade, a mulher de Brotas não vai ao samba na canção folclórica Pot-Pourri de Nené, gravada por Mariene De Castro. Enquanto isso, um garoto espera pelo pai, que, segundo Nana Caymmi – filha de Dorival – em Cala Boca Menino, foi para o Cabula, localizado no centro da península soteropolitana. Já Elis Regina dizia que, quando morresse, queria ser enterrada na Lapinha, na interpretação da saudosa canção sobre o bairro composta por Baden Powell e Paulo César Pinheiro.
Um sorvete na Ribeira e uma fitinha amarrada no Bonfim
É um “olhar estrangeiro” do paraibano que cresceu em Brasília e se erradicou no Rio de Janeiro, Herbert Vianna, que voltou os olhos para as palafitas e a pobreza de Alagados, ao citar também a favela carioca da Maré e a jamaicana Trenchtown no sucesso d’Os Paralamas do Sucesso. Continuando pela península, “pra Ribeira, foi namorar” o João do clássico Domingo no Parque de Gilberto Gil, com a participação de Os Mutantes. Uma ode ao bairro é feita pelo grupo Vixe Mainha em Ribeira, enquanto Margareth Menezes traz o gosto do inesquecível e tradicional sorvete do local em sua Lambadinha da Ribeira.
Se acima dali, a maranhense Alcione vem da Ilha de Maré, uma das três na Baía de Todos os Santos que pertencem à capital, para a lavagem do Bonfim, dá para ter uma ideia da devoção dos soteropolitanos em seu peculiar sincretismo religioso. A famosa Igreja do Nosso Senhor do Bonfim, cujas escadarias são lavadas com banho de cheiro toda segunda quinta-feira de janeiro, também são marcadas pelas icônicas fitinhas do Bonfim em suas grades, e são para onde vai a célebre baiana cantada por Carmen Miranda na música de Dorival Caymmi, O Que É Que A Baiana Tem. Seguindo o roteiro religioso da região, logo abaixo está o Santuário de Irmã Dulce, cujas obras sociais da beata brasileira receberam, em 1988, a renda integral da canção criada pelo publicitário Nizan Guanaes para uma campanha que contou com os primeiros astros do axé e, que se tornou um hino do carnaval baiano, We Are The World of Carnaval.
Somos do Pelô
Na versão ao vivo do cantor Netinho que popularizou ainda mais We Are The World of Carnaval, o artista ainda fez um pot-pourri com outros dois clássicos carnavalescos. Um deles é Um Frevo Novo, de Caetano, que fala da famosa Praça Castro Alves que divide a Cidade Baixa da Alta. Aliás, a Baixa do Sapateiro também foi lembrada na canção homônima de Ary Barroso e na bossa nova de João Gilberto, Bahia com H, junto com outros bairros históricos da Cidade Baixa: Barroquinha, Calçada e Taboão.
O outro clássico legitimamente do axé cantado então pelo Netinho foi Prefixo de Verão, música da Bandamel tocada em qualquer trio elétrico que se preze na cidade. Todos na pipoca ou nos camarotes ecoam juntos o verso “Eu sou do Pelô”, mas ninguém sintetiza tanto o local mais turístico da cidade quanto o Olodum. O famoso bloco-afro internacionalmente conhecido após gravar com Paul Simon e Michael Jackson sempre fala de suas origens, seja deixando claro de onde seus tambores começam a tocar, a exemplo de Alegria Geral, Faraó Divindade do Egito e Ladeira do Pelô, ou recordando o passado escravocrata do local e as raízes africanas presentes em suas composições históricas, como Revolta dos Búzios e Pelourinho, Cultura Africanizada, entre muitas outras.
Rodando São Salvador
Bel Marques percorre vários pontos da capital baiana com o Chiclete com Banana em Por Um Beijo Seu, indo da Ponta do Humaitá ao Farol da Barra, passando pelo Pelorinho e Campo Grande, mas não tanto quanto Banda Mel Sambando Pelos Bairros – Boca do Rio, Ribeira, Liberdade, Itapoã, Lapinha, Periperi e Pelorinho – ou Saulo Fernandes visitando inúmeros locais em Vú – Liberdade, Federação, Cruz da Redenção, Vale das Pedrinhas, Barris, Armação, Uruguai, Alagados, Gamboa, Taboão, Santo Antônio, Periperi, Pero Vaz, Nordeste Beco da Ribeira e Relógio de São Pedro. Dorival Caymmi também conheceu todas as 365 Igrejas da cidade que, reza a lenda, tem uma para cada dia do ano na música – aqui interpretada por Lana Bittencourt.
Faixa Bônus
O artista que mais cantou a Bahia, também celebrou sua capital em São Salvador, porém, é curioso que uma das canções que melhor expressam e que marcaram este espírito musical soteropolitano não cite em nenhum momento o nome do município: O Canto da Cidade, de Daniela Mercury.
Se fosse fazer uma lista de todas as músicas que falam genericamente de Salvador, a playlist duraria um dia inteiro! Mas, se alguma canção sobre um cantinho dessa cidade ficou de fora da nossa lembrança, relembre nossa memória nos comentários ;)