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Foto do escritorNayara Reynaud

TRAMA FANTASMA | Sob controle

Atualizado: 10 de ago. de 2020


Daniel Day-Lewis e Vicky Krieps em cena do filme Trama Fantasma (Phantom Thread, 2017) | Foto: Divulgação (Universal Pictures)

Se fosse necessário escolher uma palavra para definir certos títulos, a de Trama Fantasma (2017), com certeza, seria “controle”. É ele que rege o primeiro filme britânico de Paul Thomas Anderson e se manifesta em vários níveis da obra, indicada a seis Oscars, incluindo o prêmio principal e o de Melhor Direção. Esta, aliás, exemplifica este domínio do cineasta que, desta vez, não apenas dirige e roteiriza, como também fez a fotografia do seu novo longa, todo filmado em 35mm.

Sim, ele também conta com o trabalho esmerado de uma competente equipe técnica, especialmente de Mark Bridges com o figurino que é praticamente um personagem nessa história ambientada no mundo da alta costura de Londres no início dos anos 1950 e de Jonny Greenwood com uma trilha sonora que evoca os melodramas da época, sendo ambos também indicados pela Academia. Esse conjunto permite ao diretor provocar uma imersão que, se em um primeiro instante remete à capacidade de Todd Haynes de transportar o espectador para filmes que realmente parecem rodados naquela época, embora com temáticas dificilmente abordadas no período, logo traz uma estranheza própria a Anderson.

Um rigor narrativo extremamente calculado, assim como as atuações, que encontram sua melhor síntese em Daniel Day-Lewis e seus estudados gestos e olhares, além de seu “método”. Em seu último trabalho antes de sua prometida aposentadoria, o ator recordista do Oscar com três estatuetas em casa, por Meu Pé Esquerdo (1989), Sangue Negro (2007), do próprio PTA, e Lincoln (2012), e mais uma indicação neste ano, pediu, por exemplo, para encontrar a atriz luxemburguesa Vicky Krieps somente na cena do primeiro encontro de seus personagens, a fim de manter o sentimento de primeiro encantamento deles. Um mergulho total que mostra seu perfeccionismo e excentricidade, que casam perfeitamente com seu protagonista, o metódico e temperamental estilista Reynolds Woodcock.

O público o conhece no seu costumeiro período de troca entre suas mulheres-musas, as quais usa para nutrir sua criatividade até a última gota e depois as descarta através do desprezo. Sua nova vítima é a garçonete Alma, vivida por Krieps, a quem conhece em um café ao passar uma temporada fora da capital inglesa e pede para guardar o papel da longa lista de pedidos que fez para seu desjejum. Depois de um jantar, a jovem serve de modelo para o artista criar modelitos feitos sob medida para ela e, logo, é introduzida à regrada rotina da casa dele em Londres.

Lá, quem comanda toda a engrenagem caseira e fabril para deixar ao gosto do estilista é a sua irmã Cyril, interpretada por Lesley Manville. Habituée nos filmes de Mike Leigh, como Segredos e Mentiras (1996) e Um Ano Mais (2010), ela recebe sua primeira indicação ao prêmio da Academia, na categoria de Atriz Coadjuvante, por uma atuação que revela nos detalhes a relação de influência e subjugação que estabelece com o irmão, em um jogo de poder que ocorre naquele grande, mas claustrofóbico ambiente e que se altera com a presença da moça. A princípio, a dinâmica recorda a do suspense gótico Rebecca (1940) – cuja história adaptada do romance de Daphne Du Maurier é semelhante a do livro da brasileira Carolina Nabuco, A Sucessora (1934), transformado em uma telenovela homônima em 1978 –, mas nesta trama fantasmagórica desde as mensagens escondidas na costura ou na presença invisível da mãe na vida de Reynolds, o suspense psicológico se constrói mesmo no mórbido relacionamento dele com Alma.

Na realidade, os ecos de Trama Fantasma com o primeiro filme hollywoodiano de Alfred Hitchcock são mais profundos. As coincidências que lidam o protagonista daqui com o diretor de lá, elencadas por Todd McCarthy em sua crítica à The Hollywood Reporter, sugerem este olhar para os artistas que, assim como o cineasta e suas atitudes questionáveis com suas atrizes, utilizam suas musas ao seu bel-prazer. A chave da obra, no entanto, é a caça subverter a lógica e enredar seu caçador.

A moça, cujo passado desconhecido não importa para a trama, nutre o ego de Woodcock, mas igualmente o desafia. Quando seu prazo de validade parece vencer, a musa faz de tudo para se mostrar indispensável para o amado, usando até o método de libertação feminina de O Estranho Que Nós Amamos (2017) de modo engenhoso e tornando aquela relação gradualmente mais doentia, à medida que o público também fica mais intrigado com Alma e o talento de sua intérprete Vicky Krieps, que recentemente fez a esposa do protagonista da cinebiografia O Jovem Karl Marx (2017). Assim, a Trama Fantasma também enreda pacientemente o espectador com sua narrativa e seus personagens polidamente excêntricos, mas sua estranheza deixa um vazio depois a projeção de seu alinhavado cinematográfico.

 

Trama Fantasma (Phantom Thread, 2017)

Duração: 130 min | Classificação: 12 anos

Direção: Paul Thomas Anderson

Roteiro: Paul Thomas Anderson

Elenco: Daniel Day-Lewis, Vicky Krieps, Lesley Manville, Camilla Rutherford, Gina McKee e Brian Gleeson (veja + no IMDb)

Distribuição: Universal Pictures

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