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Foto do escritorNayara Reynaud

CINQUENTA TONS DE LIBERDADE | Do tropeço às algemas

Atualizado: 13 de set. de 2020


Dakota Johnson e Jamie Dornan em cena do filme Cinquenta Tons de Liberdade (Fifty Shades Freed, 2018), terceiro longa da franquia Cinquenta Tons de Cinza | Foto: Divulgação (Universal Pictures)

A trilogia cinematográfica baseada na série de livros de E.L. James chega ao seu capítulo final em Cinquenta Tons de Liberdade (2018) com os louros dos êxitos de bilheteria dos anteriores – ainda mais considerando a classificação indicativa – que acrescentaram um novo público à base de fãs do trio de best-sellers e os tropeços artísticos de uma franquia que não conseguiu se livrar das amarras do material adaptado. Em Cinquenta Tons de Cinza (2015), havia uma tentativa sincera, mesmo que irregular, da diretora Sam Taylor-Johnson e da roteirista Kelly Marcel de fazer um primeiro filme que apresentasse algo a mais do que a fraca prosa literária que tem como ponto de partida. Porém, as escolhas da dupla geraram discussões com a autora, que assumindo mais poder na produção, colocou o marido Niall Leonard no roteiro e James Foley na direção de Cinquenta Tons Mais Escuros (2017), que se aproximou do nível questionável do texto de origem.

Tendo o mesmo time criativo do anterior, a terceira história começa com o casamento da agora jovem e não mais tão tímida editora Anastasia Steele (Dakota Johnson) e do controlador e milionário empresário Christian Grey (Jamie Dornan). Partir justamente do usual “final feliz” para mostrar o que acontece depois da noite de núpcias rende ao longa um jogo de poder matrimonial que soa interessante, mas é subutilizado, ainda que conduza a escassa trama. Do mesmo modo, pensando em sua construção e no caráter original da publicação, não é possível esperar grande rebeldia da protagonista – talvez, se Taylor-Johnson continuasse à frente do projeto, quem sabe – e menos ainda da produção, que diferente de Ana neste último episódio, nunca ousou desafiar sua figura dominadora.

O Sr. Grey continua um dominador, não só na intimidade do casal, o que em si não teria problema já que há consentimento de ambos, como na vida da esposa, interferindo nas decisões dela desde dirigir um carro e sair com a amiga até o seu trabalho e o próprio nome. Em vez de retratar a complexidade de todos os tons de um relacionamento abusivo, a obra prefere apoiar o personagem, tratando-o de maneira romântica. Essa tal liberdade do título não é verdadeira nem quando Ana ameaça tomar uma atitude, pois tanto ela quanto o roteiro acabam acatando as ações dele e justificando como protetoras, amorosas e, no máximo, consequentes de um trauma de infância, fazendo com que tudo ficasse bem.

Da mesma maneira, a produção permanece pouco libertadora em seu discurso sexual. O pudor da trilogia nada tem a ver com o fato de necessariamente não utilizar nudez e/ou sexo explícito nas cenas, mas em não imprimir a paixão, furor e libido que os jogos de sadomasoquismo entre os dois pediriam, seja por culpa do texto ou da direção. Aqui, alguns desses momentos ganham o acompanhamento de versões “sexys” de clássicos do INXS e James Brown, com a inglesa Bishop Briggs cantando um Never Tear Us Apart cuja letra não se encaixa tanto ao clima da cena, enquanto o contrário acontece na sequência com I Got You (I Feel Good) na voz da compatriota Jessie J. Essa irregularidade também se apresenta no resto da seleção musical, novamente calcada no pop atual, incluindo uma música nova da figurinha carimbada na franquia, Sia, mas que coloca um Young Americans do David Bowie sem motivo aparente – a trilha sonora original de Danny Elfman continua exagerada, porém aparece menos neste longa.

Tentando lidar com este romance erótico, Foley, de O Sucesso a Qualquer Preço (1992) e A Estranha Perfeita (2007), entre outros trabalhos, prefere apostar na parcela de thriller dramático da história final, que, além de fora do tom, recorre a fórmulas comuns em novelas, como a do “sequestro do último capítulo” e flashbacks, incluindo o do tropeço onde tudo começou. O roteiro de Leonard incita uma subtrama com o irmão de Christian, Elliot (Luke Grimes), e a amiga de Steele, Kate (Eloise Mumford), para rapidamente deixá-la de lado, assim como apresenta diálogos fracos, ainda que menos repetitivos que o anterior. Jamie Dornan não consegue domá-los para si e a cena de uma revelação para o Sr. Grey comprova isso e como o ator não deixou um bom legado com a franquia, enquanto o esforço de Dakota Johnson em tentar extrair seu melhor do que tem em mãos, captando um pouco da atenção do público mais insatisfeito com o conteúdo, deve lhe render mais oportunidades, assim como as que obteve com o cineasta italiano Luca Guadanino, de Me Chame Pelo Seu Nome (2017), em Um Mergulho No Passado / A Piscina (2015) e no futuro Suspiria (2018).

Às vezes, parece que a própria produção se sente mais confortável com seu caráter trash, fazendo a uma hora e quarenta e cinco minutos de filme fluírem rapidamente e, curiosamente, engraçado. E até o espectador mais cínico, já calejado pelo segundo longa, não precisará recorrer à palavra de segurança e gritar "vermelho" com Cinquenta Tons de Liberdade, pois estará preparado para tornar esta experiência mais prazerosa do que punitiva.

 

Cinquenta Tons de Liberdade (Fifty Shades Freed, 2018)

Duração: 105 min | Classificação: 16 anos

Direção: James Foley

Roteiro: Niall Leonard, baseado no livro “Cinquenta Tons de Liberdade” de E.L. James

Elenco: Dakota Johnson, Jamie Dornan, Eric Johnson, Eloise Mumford, Rita Ora, Luke Grimes, Victor Rasuk, Max Martini, Jennifer Ehle, Marcia Gay Harden, Bruce Altman, Arielle Kebbel e Brant Daugherty (veja + no IMDb)

Distribuição: Universal Pictures

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