6° de Separação #1 | De Gaye a Gal, um single quase perdido de Hendrix entre clássicos e hits
Atualizado: 21 de abr. de 2020
As informações sobre amigos em comum do Facebook podem surpreender e reforçar a impressão de que o mundo é muito pequeno, quando você se depara que fulano é conhecido de sicrano, e por aí vai. Bem antes disso, tal ideia foi desenvolvida pelo autor húngaro Frigyes Karinthy, em um conto de 1929, criando a teoria dos “Seis Graus de Separação”, que afirma que cada pessoa está ligada à outra no mundo por, no máximo, seis conexões, ou cinco pessoas. Assunto de pesquisas científicas, ela foi popularizada pela peça de John Guare, encenada em 1990 e adaptada no cinema em 1993, sob o mesmo nome.
Sendo assim, como poderia o ícone da soul music, Marvin Gaye, estar ligado a uma das maiores cantoras da MPB, Gal Costa? Só com Amy Winehouse e John Legend resgatando um riff do início da carreira de Jimi Hendrix e os brasileiros da banda O Rappa fazendo a ponte. Veja e escute este caminho musical na estreia da nova seção Seis Graus de Separação.
*Você pode ouvir todas essas músicas nas playlists que criamos na Deezer (ao lado) e no Spotify (logo abaixo):
Marvin Gaye >
Com seu soul de fino teor social e sexual, Marvin Gaye fez parcerias com várias cantoras, mas nenhuma foi tão proveitosa quanto o álbum United, gravado em 1967 com Tammi Terrell. Dele, saiu o clássico Ain't No Mountain High Enough, que entrou no Hall da Fama do Grammy em 1999. A música, escrita pelo duo Ashford & Simpson, tornou a dupla da Motown no hit do momento, mas Terrell, infelizmente, não teve muito tempo para aproveitar o sucesso: a cantora teve um tumor cerebral e faleceu em 1970.
> Amy Winehouse >
Mas a versão tão icônica de Marvin Gaye e Tammi Terrell está presente no background de um sucesso mais contemporâneo: Tears Dry Own Their Own, que Amy Winehouse compôs em cima de um sample da clássica canção, interpolando elementos do single de 1967 a sua própria melodia e letra.
A cantora sempre teve um repertório com muitas referências e homenagens a grandes nomes do soul e do jazz, com versões, a exemplo de Cupid, do Sam Cooke, e o uso de samples, como fica bem destacado em Tears Dry Own Their Own. Mas outra música do marcante e confessional álbum Back to Black (2006) que também faz uso do mesmo recurso, e grande parte do público desconhece, é He Can Only Hold Her – talvez, a que melhor resuma Amy por trás de sua persona e a imagem que criaram para ela.
Só que o “empréstimo” em questão não é de Doo Wop (That Thing), de Lauren Hill, que ela costumava cantar em um mashup com a faixa durante a turnê.
> John Legend >
Até que você se depara com uma faixa desconhecida de Once Again, segundo álbum de John Legend, lançado também em 2006, e escuta o mesmo “Da da da daaaaa, da da da daaa uhhhh” de He Can Only Hold Her. O nome da música é Slow Dance e você começa a pesquisar na internet pra saber se alguém copiou do outro a melodia, pois são tão semelhantes...
> Jimi Hendrix >
... No entanto, a raiz de ambas as músicas está em um riff de Jimi Hendrix. Na realidade, de James Marshall, pois era este o nome com o qual o guitarrista assinava em seu início de carreira. Em 1966, ele tocou guitarra na gravação de um single do duo The Iceman. A faixa (My Girl) She's a Fox, composta por Richard e Robert Poindexter, aparece em outros discos além do vinil 7” de Gino Armstrong e James Stokes, porém, sempre creditada a Jimi Hendrix e ao arranjador original, Lonnie Youngblood.
O artista ficaria conhecido mais tarde como um exímio guitarrista, além de cantor também, com sua própria banda The Jimi Hendrix Experience, cujo single de estreia foi Hey Joe. A canção registrada por Billy Roberts e gravada primeiro pelo The Leaves, ganhou as paradas com Hendrix contando a história deste homem em fuga após matar a mulher que o traíra.
> O Rappa >
Hey Joe também ganhou a sua versão brasileira com a banda carioca O Rappa, que, em seu segundo álbum, trouxe a música com letras de Ivo Meirelles e do então baterista Marcelo Yuka focadas nos problemas diários da população das comunidades e favelas, além da participação especial do rapper Marcelo D2, do Planet Hemp.
No mesmo disco de 1996, Rappa-Mundi, que alçou a banda ao sucesso nacional com várias faixas que emplacaram nas paradas com a mistura de rock, reggae e rap deles, existe outra versão, mas de um clássico da MPB, Vapor Barato.
> Gal Costa
A composição de Jards Macalé e Waly Salomão ficou famosa na voz de Gal Costa, que a gravou com uma pegada bem rock’n’roll no compacto duplo Gal, de 1971. Mas ela eternizou Vapor Barato na versão mais intimista que deu à canção, cantando ao vivo na gravação do show de sua turnê “Fatal”, disponível no álbum Fa-Tal - Gal A Todo Vapor, do mesmo ano – em plena ditadura militar.